Ao pássaro e outras coisas mais

Quanto tempo ainda vai ficar aí parado,

olhando pras suas memórias...

será que pode ir em frente?

Seu Porto secou na garrafa,

seu anel de cristal quebrou sua proteção...

seus amigos, espíritos maus,

retornam à casa subindo as escadas,

de lá de cima vejo São Paulo,

prédios que não são mais meus.

O céu daqui que é meu

é de vocês também,

atrás daquela montanha

estão meus amigos e alguém...

Preciso esquecer.

Mas como esquecer tua língua,

tua fala e teus olhares?

Como esquecer dos sete dias,

da canção e da dança,

das asas, do perfume dos teus cabelos?

Menino, sincero seja!

Faça doer-me a incompreensão,

dos teus dedos o último toque,

a última separação,

a frase última,

o adeus mais cansado.

Amedrontava-me a pouca distância

até que em sonho beijei-te com fúria...

ventania, tempestade,

mata-me a sede,

anjo, animal, afogado...

durma em meus braços, meus abraços.

Pernas e passos,

rodas, rodinhas, machucados,

devolva-me o vento,

o perigo e a dor.

Desastre de carro, avião sem combustível,

mares à vista,

vou jogar-me da janela,

descer a rua,

coberta de espuma,

equilibrar estrelas.

Menino, durma de novo comigo...

em meu travesseiro você se esconde,

quando adormeço ainda me responde,

sincero seja!

Meu pesadelo é cruel como a brisa.

Meu sol é lua nova na manhã,

que desperta...

chorando as fadas incrédulas,

de asas quebradas, ave, não voe!

Não navegue esse mar de sereias,

pra longe dos meus olhos;

não peço muito...

queria apenas que me visse feliz...

todo mundo já me viu chorar,

uns, cedo demais para pode esquecer,

estão nadando em mar tranquilo

longe daqui.

Estavam todos lá atrás me chamando

enquanto eu lembrava a loucura,

feliz por saber não ser a única...

desesperada enquanto te desesperavas à toa,

amiga tola! Hoje quem perde sou eu,

de cabeça para baixo, no escuro, evolando-me.

E eles me chamavam,

eu não queria ouvir,

estava calma e dormente.

Beije-me, menino dos meus olhos!

Suga-me a vida e a fome,

célticas danças que esqueci,

levada pelo vento,

o vento coma-me a alma...