ENQUANTO A GRAMA CRESCIA
a grama alta crescia
e o caminho desaparecia
nem luz nem brilho
nem estrela-guia
onde os pés tocavam
estrada não se via
e o homem descalço
o chão debaixo de si não sentia
a cabeça apontada para a lua
o nariz roçando o infinito
a grama alta sim crescia
às onze horas no meio da rua
rasgava o asfalto a tenra erva
tudo sumia enquanto ela crescia
o céu importância perdia
pois diferença entre noite e dia
não havia
e o homem cansado
despojado de seu terno surrado
a boca seca, a vista ardia
a mão acenando perdida
a boca seca de sede queimava
a grama alta mais crescia
o rumo a andorinnha perdia
de tanto que a erva sufocava
tudo morria enquanto ela crescia
o mar afogou-se em daninhas
para desgraça das criaturas marinhas
abandonadas, sozinhas
e o homem descrente
do último pão não comia
a ceia lhe dava azia
o coração enlutado tremia
a alma pusilânime gemia
enquanto a grama crescia...