A VOZ

mansa

mais que suave,

como de hábito,

falou sussurrada:

preciso me desmanchar

aos carinhos nos cabelos

tirar as alças da calcinha preta

com pose de soslaio

deixar a bunda empinada

calar, calar até enlouquecer

a nuca nua para beijos.

grave,

mais que suave,

como de hábito

revelou seriedade:

preciso me desatinar

aos calores desse peito

bater as asas e os corações

com pose de paixão

voar pelo tempo do pacto

jurar, jurar até a transfusão

do sangue engarrafado.

intensa,

mas sempre suave,

como de hábito,

sem o amargor do jiló

nem o salgado da estrela,

puxou-me, severa, as orelhas.

Quantos cuidados de amor para comigo!

Precisas dormir, pelo menos, oito horas ao dia

para que seja companheira e sono,

precisas andar, pelo menos, um quilômetro de manhã

para que seja claridade, suor e medo,

precisas tomar, pelo menos, um litro e meio d’água ao dia

para que seja amante de copo e gargalo,

precisas mastigar, sem pressa, meu corpo morto de fome

para que seja mulher de fato, prato e talher.

quieta,

mais suave ainda

como de hábito,

com água e sal

gargarejou para falar