A NOITE DE PEDRO PÁRAMO
Silencia o trovão amordaçado pelo árido deserto,
a noite macilenta
aprisionada pelas violentas gárgulas do rancor, arqueja.
Noite que alimenta sombras, matriz de espectros
que deambulam pela árida terra dos mortos.
Noite fantasiada de carranca de proa
naufraga em angustiados alfabetos.
(O abismal relato de Juan Rulfo penetra nos ouvidos
e na alma,
enquanto falanges descarnadas escavam lembranças.)
Nada se mexe no horizonte.
Nada se mexe nessa noite sem estrelas.
Noite de meninos mortos
enterrados em caixões brancos com arabescos.
Noite desabitada – sem esperanças, morta,
quase um contorno de casas em penumbra,
as portas uivam e quebram lúgubres sombras.
Sucumbe, verticalmente, a noite e impulsiona o vento
que arremete contra esse povoado poeirento e olvidado,
trancado entre paredes de espectros e de traumas.
Pedro Páramo espreita nossos passos
com seus olhos cruéis
transforma-nos em monólitos de pedra
e ficamos como estatuas avassaladas,
inertes,
no árido deserto de Comala.