Gelo

Entrei, deixei a vida do lado de fora

Entrei despencando a minha nuca no velho sofá

Eu deixei a minha vida morrer de frio na calçada

Eu permaneci com a cabeça encostada

fumei, fazendo sair de minha boca

tudo que continha na minha alma

Concentrei-me no barulho do relogio

Parei meus olhos no mármore branco,que talvez nem mármore fosse

Olhei-o até acreditar que eu também fazia parte dele

A integração, o branco hipnótico, a ausência de memória

Encarei a palidez do mármore com a certeza de ser o sentido da vida

O nada

E por ali se passaram anos, tragédias e monólogos

E o universo inteiro coexistindo a ausência de todos os universos

E eu não vi nada,

talvez por não haver nada pra ser visto além do que sentido

Levantei, abri a porta e recolhi a minha vida cogelada na calçada

Agasalhei-me com ela, mas já era tarde de mais

Era gelo que corria agora em minha veias

Eu havia congelado há anos