IMORTALIZAÇÃO - POEMA 105

BEM NO FUNDO DE TODAS AS NOSSAS ALMAS

HABITA UM MONSTRO QUE NÃO DESEJAMOS ESCUTAR

QUE NOS DIZ BAIXINHO EM NOSSOS OUVIDOS

O QUE NÃO QUEREMOS ESCUTAR

MAS JÁ É POR NÓS, SENTIDO E SABIDO.

ESSE MONSTRO ATENDE POR DEUS!

MAS DEUS NÃO É ISSO OU AQUILO. TAMPOUCO MONSTRO.

APENAS VIVEMOS COMO CATEDRAIS DE UM OLHO SÓ

AQUELA ESCOLA CALOU A NOSSA ALMA INQUISIDORA

AQUELA MISSA NÃO SE IMPORTOU COM QUEM EU ERA.

SOU NADA. ÉS NADA. SOMOS TEIAS

AS TEIAS TECEM-SE A REVELIA DOS DEUSES.

PERCORREM OS ERROS DA ALMA E REVISAM OS ACERTOS.

TORNAM DESERTAS AS POSSIBILIDADES DO CERTO.

MATAM A MAIS DOCE ESPERANÇA DO PROVÁVEL.

AS TEIAS NÃO PRESTAM, AS VIDAS NÃO ERRAM.

ATIRAMOS SOMOS AOS CORDÕES DO CRUEL ASSOMBRO.

NÃO SOU, NÃO ÉS. NADA SOMOS!

SOU NADA. NEM SOU A PEDRA, O LIRIO OU A UNIVERSIDADE

A POSSESÃO OU A NUVEM.

O QUE ME AMEAÇA SÃO PONTOS NO TEMPO.

UM CALENDÁRIO QUE NUNCA DORME E NÃO RENOVA O CENÁRIO.

DA JANELA, EU VEJO UM VULTO NA NEVE

AOS POUCOS, TORNA-SE IMENSO E VIGIA AS PORTAS

DO TEMPLO E DO TUNEL DO TEMPO.

FAZ-ME SACERDOTE DA ORDEM SECRETA DO MAL DA DUVIDA.

PARA ESQUECER TUDO ISSO, FUGI DE MIM.

ASSASINEI-ME POUCO A POUCO NO ATEU

NA DESCRENÇA DE PEIXES NOS ASTROS E NA ETERNIDADE

NO ANONIMATO QUE VESTE DE LINHO OS HEROIS DO CAMPO

NO RUIDO QUE VEM DO RIO

NA CAMA REFEITA PARA O NOVO MORTO.

AUSENTE DE TODA AQUELA FESTA.

NA CERTEZA DE QUE JAMAIS SERIA IMORTALIZADO.

MAURICIO DE AZEVEDO

METEMPSICOSES - A ALMA DE FERNANDO PESSOA