O PORTÃO

eu menino atrás de um portão apodrecido

brincava entre cristais de vaga-lumes

anda-andando no cinza eterno de um entardecer poente

fragrância de cenoura arrancada à terra

ferida pelo rastelo no pentear das folhas

no assobio do vento triste de quase outonos europeus

fascinava-me o colorido mágico das pipas a driblar nuvens

nas mãos dos meninos que eu não podia ser

a rua proibida

depois o primeiro dia na escola

lancheira com cheiro de maçã e pão pullmann

bolsos cheios de açúcar

que as balas alabardas iam melando

e eu chupava pensando serem

lágrimas verdes de altos pinheiros

que havia nos quintais das vendas

onde foi esse menino que fui?

atrás de um portão apodrecido

minha infância empalhada

perdeu-se para sempre de mim

José Martino
Enviado por José Martino em 19/10/2006
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