O PORTÃO
eu menino atrás de um portão apodrecido
brincava entre cristais de vaga-lumes
anda-andando no cinza eterno de um entardecer poente
fragrância de cenoura arrancada à terra
ferida pelo rastelo no pentear das folhas
no assobio do vento triste de quase outonos europeus
fascinava-me o colorido mágico das pipas a driblar nuvens
nas mãos dos meninos que eu não podia ser
a rua proibida
depois o primeiro dia na escola
lancheira com cheiro de maçã e pão pullmann
bolsos cheios de açúcar
que as balas alabardas iam melando
e eu chupava pensando serem
lágrimas verdes de altos pinheiros
que havia nos quintais das vendas
onde foi esse menino que fui?
atrás de um portão apodrecido
minha infância empalhada
perdeu-se para sempre de mim