Salvar-me do nada

Rebolei na relva algures no tempo,

viagem a um campo verde sem sombras,

repleto de sol,

virei, revirei rolando em desequilibrado centro

gravitacional,

tudo visto do avesso, torto, distorcido pela tontura,

barriga para cima e braços bem abertos

acalmei o sopro olhando infinito céu azul,

cheiro de terra invadiu as narinas penetrando,

profundamente, na fusão desmesurada

natural do fim,

ser que nada é,

osso, vísceras, vómito,

tudo decomposto na hora certa mesmo que não o queira,

pretenso ficar imortal,

nem o amor repentino, sôfrego,

dura eternidades nas cartas sem selos,

apenas a pele tatuada se manterá mais sete dias

desta transformação fatal, final,

na eternidade de um sertão sem memória.

Finalmente encostei esta carne à terra fria, húmida,

como um mineiro descalço

regressei à mãe rastejando, querendo salvar-me

do nada,

da poesia,

de mim próprio,

do pensamento no moribundo.