O CONTEÚDO DE TUDO BUSCO NA FARTURA DE FALTA

O conteúdo de tudo

Busco no fundo do mergulho

Na curva do rio

Onde pára o que não presta

O que resta

No galpão da reciclagem

Na margem do rio

Na música que respiro

Na letra errada e sem plural

No molejo/ movimento dos barcos e homens

Nos sem nomes na estrada

Nos homens dos pontos de ônibus que não chegam

Na ferida aberta

Sangue derramado na quebrada

O conteúdo de tudo

É uma fartura de falta

De negação

De degeneração induzida

Na buzina ardente da cidade

No sol a pino do sertão

No deserto dos corações

Na solidão urbana

Nos danos seculares

Na rapa do tacho

Nos planos frustrados de um País novo

Diferente deste de agora

E de ontem

Feito de homens que traem suas origens

O conteúdo de tudo

Busco na fibra dos fracos

Dos resistentes

No molejo do corpo arcado pelo peso da vida

Nas rugas precoces do catador de restos

No que me resta de força

Na louça quebrada

Que vira arte na mão do arquiteto da favela

Arte bruta/ arte culta do povo

Que ensina aos mestres cultos

Como Villa-Lobos/ Jobim

O conteúdo de tudo é a rima possível

De pé quebrado

O solo sagrado dos índios

O riso que encontro na criança

Na dança

Na magia da arte popular

Na fé da fé popular

Nos lares feitos de fibra pura

Das ruas sem asfalto

Do mato que cresce nos vãos dos viadutos

No matuto

No chão bruto e ressecado

Nas letras espalhadas por aí por aqui pelo poetas

Pelos inquietos

Pelos que não calam

Pelos como eu que falam pelos cotovelos..........