Apenas um café forte

Pegadas na areia molhada mar adentro

desfeitas uma a uma nas ondas repetidas

sem correntes, libertas, independentes

de fronteiras mesmo das rochas mais escuras

promontórios indefinidos, ameaçadores cabos invadindo,

desvirginando águas profundas,

um homem macaco saltava, refugiava-se na areia seca,

criança destruindo castelo de areia como guerreiro espartano,

mulher sereia mergulhando, batendo cauda na fusão com mar revolto,

ideal difuso angústia interior, ansiedade por tantas imagens,

onde se surpreendiam olhares buscando explicações,

nem concentração, imaginação, resistia a quente sol,

vida elaborada de nadas em movimentos constantes,

lembrei Posidon e deuses supremos capazes de transformar

mar calmo em impiedoso num simples movimento,

Shiva transformadora e o amor em Krishna, falsas comparações

com Natureza em fúria, artifícios humanos,

vozes discutindo sexo dos anjos lá longe

em visão distorcida.

Hoje vi o mar limpando tantas ideias perdidas,

encontrando ilusória paz,

nada mais queria, nem escrever apetecia,

apenas um café forte.