SERTÃO DE RAPADURAS
Tão longe,
no fim de Deus
onde a chuva vem do pó
de gente que não nasceu
para adoçar rapaduras.
é olhar seco de raiva
riso amarelo na cara
inchada por tanto doce
panela vazia no dente
doído pela extração
do doutor-cirurgião
doido para arrancar
onde mora sua mágoa
nascida para cortar
a cana de boca murcha.
As mulheres,
galhos ressecados
envelhecem lua após lua
cansadas de parir ódio
puseram bosta de boi
para o sangue não chorar.
é irmão cegando irmão
boi comendo carcará
um parabelo por filho
em vez lápis de apagar
a cartilha do pai sisudo
que não ri para mostrar
a camisa amarelada
a cova onde deita raso
o filho, ontem, vingado
na encruzilhada da cruz.
Os filhos,
os que ainda restam,
ainda mordem os roletes
dentro dos canaviais
adoçando a pólvora
nas mãos criando balas.
rompe-se o luto jurado
do medo da tocaia
o amor é engrenagem
mola-mestra da história
que fez a chuva alagar
o sertão com água do mar
tão longe, no fim de Deus
choveu pelo céu e pelo sol
até um menino chorar
sob o céu iluminado
abaixando a poeira.