Somos assim...
Faço o caminho inverso da lembrança
Quer o tempo penetrar na memória?
Não, não deixo que me faça escrava,
Tudo que é guardado é minha lavra.
Não, nada poderá apagar a minha história.
Desarquivo meus sonhos, desvarios,
No espelho, um semblante apagado,
Letras letárgicas, notas destoantes,
Atravesso por embolorados rios,
Um oco, um estrondo,
Acordo pagã,
Com medo de ser amanhã...
Fomos ou somos?
Eu sei quem fui, sei quem sou,
Transpus a plenitude do tempo
Num gozo feliz e sem lamento,
Trago vincos da falta de abrigo,
Nem sempre frustrações nem sempre riso,
Se vivo é porque corri muito perigo!
O tempo em mim roga morada,
Dou agasalho, um chão, guarida,
Ao largo sigo trotando a paz,
Isolei no abissal dos sonhos
A alma, o sentir, o secreto divagar,
Nessa seara, o tempo não há de pisar.
Ele não me doma,
Eu também não o tenho,
Somos soltos sons dissonantes,
Para que em passos loucos e errantes,
Sigamos caminho atroz,
Pisando flores e pedras,
Nacos de dores lancinantes,
Ou inalando aromas vindo de nós.
Nada vou redesenhar,
Pintura e obra já são feitas,
Nada há por acabar,
Seguirei ora ruas largas,
Em outras estreitas,
Meus versos serão a inequívoca expressão,
E sempre dirão de mim,
Do que avassala,
Do que deságua do coração...