[Se te Releio... Se me Releio]
[Ao genérico leitor-escritor que, junto comigo,
cria, sem cessar, o material orbitante na Grande Rede...]
_______________________
Tempo I
Se te releio, creia-me, companheiro...
É com toda a suavidade, com todo o apreço pelo teu direito à individualidade, com todo o carinho, com ansiedade até, se me permites, que eu volto a ler-te, e a referver nas minhas veias, a emoção de saber do teu jeito de caminhar. E assim, torno a achar muito pequena, ou descabida, a reflexão que antes te enviei, e também esta que ora estou a te escrever.
Tempo II
Sou rude assim... argola de laço já perdeu! Se me releio, sinto-me como o cão, aquele cão que torna ao seu vômito — reler-se é repetir-se? É gostar do que se escreveu? O que eu escrevi está nas nuvens eletrônicas, são asas soltadas de mim, do meu corpo [já] perdido... Pois, como tu, eu não sou membro do “circo” —, este “circo”, em que eu nem emboco sob a lona, como fazia em criança, nos circos [de verdade] que chegavam aos largos da minha cidade... Deste “circo”, cujo ingresso é a mão de um “padrinho”, eu sou enxotado antes de me aproximar!
... Contudo, releio-me por acaso, pois fragmentos meus estão a vogar na grande rede dos nossos dias: ainda que eu não queira — e eu não quero!— basta digitar um pedaço do meu nome, ou um pequeno trecho de uma ideia, e lá estão, expostos a quem vive nestes tempos, aqueles instantes mais caros da minha solidão.
Tempo III
Convenço-me, companheiro, de que há, agora, um sentido ampliado — sem limites — do ato de ler! Podemos nos encantar com as falas de muitas pessoas fora do circo literário. E somos lidos... sim, ainda que incidentalmente, pois leitores são conduzidos por um simples clic, até os nossos fragmentos flutuantes... O circo não se deu conta de que vige ainda na “Época das Trevas Modernas – os anos anteriores a Internet.”... [Obs. Não tenho como dar o crédito desta frase ao autor – desconheço-o, pois está escrita nas nuvens... nas eletrônicas nuvens!]
Tempo IV
Ser um escritor destes tempos, Pós-“Época das Trevas Modernas”, não tem o charme de ser uma estrela de momentosas festas literárias, ou ser um imortal das velhas academias — hoje, quem se importa com as academias... senão elas mesmas?! Entreleem-se... é o que parece. [Na nossa “Academia” tem gente que mal sabe Português, e vende livros aos milhões...]
Tempo IV
Ser um escritor destes tempos, Pós-“Época das Trevas Modernas”, não tem o charme de ser uma estrela de momentosas festas literárias, ou ser um imortal das velhas academias — hoje, quem se importa com as academias... senão elas mesmas?! Entreleem-se... é o que parece. [Na nossa “Academia” tem gente que mal sabe Português, e vende livros aos milhões...].
Os tempos são outros, pois, decididamente — aqueles nossos fragmentos estarão por aí, numa estranha e fragilmente documentada imortalidade, orbitando na Grande Rede, a grande teia das nuvens eletrônicas, por muito tempo depois da nossa morte — somos anonimamente imortais? Será? Por quanto tempo? E que importa o tempo, se já estamos, estaremos mortos?
__________________________________
[Penas do Desterro, 15 de outubro de 2010]