Ato Único de Drama
Resolvi colocar essa obra aqui por não haver uma categoria para tal. Entretanto, compus de acordo com a poesia, uma vez que os recursos de rima e estrofação estão (mais ou menos) presentes.
Personagens
DONZELA (ESPOSA DO GUERREIRO)
CAVALHEIRO (AMIGO DA FAMÍLIA)
IRMÃO DA DONZELA
GUERREIRO (MARIDO DA DONZELA, CUNHADO DO IRMÃO)
MORTE
CENA ÚNICA
Entra uma donzela segurando uma vela (a sala deve estar escura). Ela entra a passos lentos, possibilitando a visualização do triste semblante.
Donzela
Sete primaveras de silêncio
mensageiros a mim nada trazem
os belos versos que a mim bem fazem
sete primaveras de silêncio.
caminha para o outro lado da sala
Donzela
Rezo por ti todas as noites, amor meu
sem ao menos saber se ainda tens vida
se pensas em mim, mesmo com feridas
nas cruéis horas que sofres sem o colo meu.
Estás bem, meu amado?
desejo a cada dia ter-te comigo.
Entra um cavalheiro bem apresentável que a interrompe
Cavalheiro
Perdoai, mas tens tempo para um amigo?
(A donzela se vira, obrigando-se a um sorriso)
Donzela
Sempre... como tens passado?
O cavalheiro toma-lhe a mão
Cavalheiro
Bem (beija a mão). Revê-la aquece meu coração
neste momento em que a nação vive intrigas
mas venho apenas saber de ti, amiga
que sentimentos tornam-lhe trêmula a mão (solta a mão).
Donzela
Bem sabes que eu nunca soube esconder tristeza
minha alma ainda chora por meu guerreiro. (dá as costas)
Cavalheiro (colocando a mão no ombro da donzela)
Esperai que a guerra acabe primeiro
Deus proverá que aos teus olhos regresse a beleza.
Tende fé, pois o impossível não existe.
Donzela
Tenho e bem o sabes! Sempre creio
mas neste mundo há muita maldade, receio... (vira-se pra o cavalheiro)
receio que em nos separar a morte insiste.
O cavalheiro olha-a nos olhos, confrontando-a
Entra na sala o irmão da donzela e este demonstra alegria ao ver o amigo.
Irmão
Amigo! Como é bom ver-te o semblante!
Cavalheiro
Mútuo é o sentimento, caro amigo
a mesma felicidade lhe transmito!
Conversava com tua irmã há um instante.
Irmão
Também alegro-me em vê-la, minha irmã (beija a mão)
trago-te novas que aquecerão teu coração.
Donzela
Que me dizes, meu irmão?
Irmão
Teu esposo, meu cunhado, regressara esta manhã.
Donzela
O que me dizes é verdade? (sua feição torna-se alegre)
do campo de batalha tornou meu guerreiro?
Ouvistes, amigo? O momento derradeiro
o momento que retorna minha felicidade!
Cavalheiro
Compartilho de teu sentimento com alegria
tuas orações e lágrimas te valeram
assim como a coragem e honra de teu esposo o valeram.
Donzela
Sim, onde está ele irmão? Dá-me alegria!
O irmão faz um sinal e dois homens entram carregando um homem
Irmão
Ele está muito ferido. Tomem cuidado.
A donzela avança em direção aos dois homens e abaixa-se junto ao marido de modo que foi possível apoiar a cabeça e ombros dele em seu colo.
Donzela
Meu amado, novamente sinto-te ao meu lado
será nosso presente como fora nosso passado
estás comigo e receberá todo o cuidado.
Ao acariciá-lo sente um lugar umedecido. Era um ferimento que ainda não havia se curado e o sangue não havia sido estancado. A donzela encara o irmão com a face assombrada.
Irmão
Como médico, fiz tudo que pude, irmã
mas o ferimento é profundo e deveras fatal.
Cavalheiro
Mas ele há de sobreviver a este mal?
Irmão
Me entristece, mas temo que não veja a manhã.
Donzela (chorando)
Não! Meu guerreiro não há de perecer!
És forte, meu amado, vencerás a agonia
não permitas que perdurem as noites frias
seja novamente o manto a me aquecer!
Irmão
Contenha-te, irmã, por caridade!
Corta-me o coração contemplar tua tristeza.
Escutando os lamentos da donzela, o guerreiro, embora fraquejando, esforaça-se para acariciar o seu rosto.
Guerreiro (falando em tom mais baixo)
Onde está o sorriso que trazia tamanha beleza?
És tão bela... és anjo de verdade?
Donzela (tentando sorrir em meio as lágrimas)
Meu adorado, não sou criatura divina.
Guerreiro
És e bem o sei, pois sempre o proclamei
para anjos e deuses, tantas divindades, mas a ti clamei
pois és a única deusa que me ilumina.
Donzela
Descansai, meu amor, guarda tuas forças.
Irmão
Ouça minha irmã, cunhado, repouse
cuidarei para que perturbá-lo ninguém ouse
descansai, guarda tuas forças.
Guerreiro
Não há o que guardar, bom amigo
é chegada a minha hora e não posso tardar.
Cavalheiro
Que dizes, amigo? Que estás a falar?
Ainda haverás de praticar espada comigo.
Guerreiro
Jamais verei novamente brilhar uma espada
companheira única nas guerras
suave movimento de sangue mancha as terras
basta, amigo, a jornada está terminada.
Donzela (ainda em prantos)
Não digas o que meu coração não quer ouvir!
De tua pobre esposa tende pena!
Guerreiro (acariciando novamente a face, secando as lágrimas)
Não chores, dozela serena
ou tristeza maior meu coração há de sentir.
Sinta-te feliz pois encontrarei minha paz
não vês a luz no horizonte? (aponta o horizonte)
é tão quente, vem de belo monte (sorri)
descrevê-la? Não há homem capaz.
Aproxima-se uma donzela em vestes brancas, caminhando lentamente. Ninguém pode vê-la, com exceção do guerreiro.
Guerreiro
És tu a morte que a mim se apresenta?
É, então, chegada a hora de levar minha alma
para o descanso, onde viverei eterna calma?
Morte
Dá-me tua mão e teu coração apacenta.
Sorrindo frente a angelical face de sua libertação da dor, o guerreiro torna sua face para a dozela que o tem por marido.
Guerreiro
Tenho de ir, minha amada, é hora
a donzela do descanso me espera (olha para a morte)
é meiga, não tem a face de fera
devo entregar minha alma à gentil senhora.
Donzela (em prantos)
Roga para que ela me leve contogo, amor meu
sem meu guerreiro, de que me vale a vida?
Permita que comungue da mesma saída
que junto ao teu espírito vá o meu!
Irmão
Que loucura pronuncias, minha irmã?
Não deves entregar-te e não o permitirei!
Donzela
Bem o sei, meu irmão, mas que farei?
Guerreiro
É tão linda a vinda da manhã... (sorri e morre)
Donzela (aos gritos)
Amor! Amor! Amor! (balança o corpo)
Cavalheiro
Aqui jaz um bom amigo, falta há de fazer
sua memória será sempre honrada
suas glórias haverão de ser por gerações cantadas
foi guerreiro, foi amigo e bem o soube ser.
A morte usa panos como se estivesse envolvendo um recém-nascido e olha para ele, uma vez que é a alma a ser levada para o mundo dos mortos.
Morte
Teu descanso agora há de começar
tua alma gozará da felicidade eterna
nessa jornada serei tua figura materna
aquela que de ti há de cuidar. (sai caminhando lentamente)
A donzela permanece segurando o corpo do guerreiro.
Irmão
Amigo, ajuda-me a carregá-lo.
Os dois cavalheiros erguem o corpo.
Irmão
Minha irmã, cuidarei para que receba as honras
não permitirei que sua memória seja alvo de desonras
despede-te, pois devemos agora levá-lo.
A donzela beija a face do guerreiro e os dois cavalheiros a cumprimentam com um aceno de cabeça. Saem deixando apenas a donzela no recinto.
O guerreiro entra na forma de espírito após um momento em que a donzela mantém-se pensativa.
Guerreiro
Tão bela, mas tua tristeza a mim entristece
alegra-te, minha amada, pois contigo sempre estarei
os teus sonhos, de agora em diante, velarei
serei o anjo que de ti jamais esquece. (abraça a donzela)
Sem entender direito porque, a donzela se abraça e sorri. Sente um calor que a conforta e acalma o coração. Ela entende que seu guerreiro está com ela, então fecha os olhos e o vê em seu coração.
FIM