Confesso (a sala das máscaras)
I
confesso tenho medo desses cantos negros
onde, incapaz de me reconhecer, permaneço estranho
inúteis tênues fios de luz a alumiar segredos
projetam-se das frestas altivos porém tacanhos
essa luz não é a luz capaz de derribar estas trevas
branca, fria, hospitalar, distante, opressora e má
como o seio estrangeiro de outras tantas terras
(que não a nossa)
já que a luz que lá tremula, não temula como cá
II
confesso já me habituei com esses cantos negros
abraçado por paredes que me inibem os membros
pequenos lampejos de lucidez me permitem questionar
aqui estou desde qual setembro?
tateio os bolsos em busca de fósforos ou um isqueiro
mas sejá não fumo porque traria tais apetrechos?
sem os fósforos não consigo me ver inteiro
sem o isqueiro perco meus eixos
(e sem os cigarros?)
III
confesso minto para parecer pior
quão macia e maternal é a mão da piedade!
essa escuridão, de todas, não é a maior
a supera o blecaute no centro da cidade
os cantos negros trazem conforto funesto
um medo que pode ser útil a um dado momento
e, para ser honesto,
acho que todo conforto provem do tormento.
IV
confesso tenho medo desses cantos negros
onde, secretamente, me dispo das convenções
onde guardo fantasias de vários empregos
da arte da repulsa ao logro das compaixões
tenho medo de mim mesmo então
já que mascarado uma outra persona me desce
esperta como a víbora ou fiel tal o cão
dependendo do tamanho da teia que a aranha tece.