Primavera
Nada sossegou em redor nessa violência constante continuada
de vento e mar gémeos inseparáveis
tudo fustigando na terra nívea de espuma,
flocos dispersos destruindo imponentes construções humanas,
arrastadas sem piedade, remorsos mesquinhos
falsos,
pensamentos inimagináveis de glória, valentia incluída,
abafados em gritos histéricos,
estéreis pronúncias negras vociferando destinos conhecidos,
repetidos,
na hecatombe uma ave permanecia suspensa em galho escuro
mirando na sua quietude, sem sequer em sobressalto
a agitação de algo já visto,
tudo repetido nos séculos de passagem furtiva,
como se a renovação abrigasse destruição
encantamento perverso revisitado,
ressentido.
Desliguei-me da cena apocalíptica
varri-a do visor,
acendendo mais um cigarro, rindo,
a primavera regressara, sentimentos desconhecidos,
esperados, reencontrados, aumentavam
fustigando-me,
tudo sossegaria enfim,
de mão dada caminharei roçando os pés na solta areia
onde uma leve brisa tudo envolverá naquela harmonia
novamente apaixonada,
entre promessas,
o mar,
em paz,
acolherá o reflexo das luzes suspensas e cintilantes.