Poço (sem fundo?) da memória

Litros e litros

de letras no poço

profundo

(ou sem fundo?)

da memória...

Entre as névoas,

elevam-se em sílabas dispersas

ecos silentes de dores e incolores riscos,

como se fossem de um lápis mental...

reminiscências levitando numa leve atmosfera

matinal, um tanto indefinida

porque precisam de uma espécie de demiurgo

coletor a compor-lhe

desenhos, escorços que sejam,

a semelhar, ao menos, linhas melódicas,

pseudoestrofes a enganar os olhos

ignaros, pois que sua falácia ótica

pode muito bem ocultar suas fraquezas

de ritmo e som.

Litros e litros

de letras no poço

profundo

(ou sem fundo?)

da memória...

Entre as páginas amarelas,

engendradas a partir de pedaços de tempo,

o poeta sussurra -- por ali -- geografias, itinerários,

tudo que per-corre a memória

na vã fuga do fundo, subindo e escorregando,

descendo um metro cada vez que sobe meio...

Desculpe... --descendo um verso, na verdade,

cada vez que sobe meio.

Sair desse poço sem fundo da memória

para cair no poço sem fundo

(ou portal) da esfera da imaginação,

será isso, o objeto último de desejo do aedo?

Ah! Pegar a poesia com as mãos,

tanger o intangível,

ouvir alguém --poderia ser eu?! -- dizer

o indizível!...

ouvir...

cheirar...

ver

o invisível...

degustar...

palavras no poço (sem fundo?) da página...

Poderá ser algo mais que apenas isso, a poesia?!