O grito do silêncio
Havia naquela sala de aula
Um grito que vinha da alma
O motivo de estar ali era observar a agitação
Da criança que quieta não parava não
Bem ali, do lado da agitação, comovia um grito
Que mais parecia um mito
Para ouvir o grito era preciso atenção
Exigia sutileza e dedicação
Um grito estranho...
Mudo...sem tamanho
Acompanhado de olhos caídos...
Sofridos...
Grito calado, parado no seu canto, na cadeira da sala
Um longo tempo de espera, um tempo que cala
Aquela criança parada ali era criança não: isso é fato pleno
Aquela criança ali era gente grande, dentro de um corpo pequeno
Olhem, vejam bem, procurem o brilho, a sensatez
Criança brinca, não tem mudez
Aquele grito mudo calado
Era um grito desesperado
Tempo depois o grito materializado, sem esperança
Agora era mais alto, era a perda da criança
Aquela criança da sala de aula, da escola
Foi rápido sem demora
Há tempos estavam roubando sua infância
Tratavam seu corpo com brutalidade, não davam importância
Por tantos olhos a criança passou
Para muitos em silêncio gritou
Grito sem eco, com renúncia
Grito de socorro, de denúncia
O grito que sem lei, lavra
O silêncio da criança, contra nossa palavra.
(Dedicado a aluna R., falecida aos 9 anos em 2005, de infecção generalizada nos órgãos internos. O motivo da enfermidade era que sofria de abuso sexual desde a mais tenra idade. A conheci a partir de uma observação de sala, para observar um aluno, mês e meio antes de seu falecimento. Sua palidez me chamou muito a atenção. Era porque morria aos poucos).