MERGULHO NO AZUL - II

Elane Tomich

Volto aos mares do sul!

Estás assim tão bonito,

vestido de maresia

conchas, pérolas,utopias,

corpo, terracota-azul

em ronda de cores, contrito.

Disseste a mim desses mares :

\'Nunca mergulhes no azul

que o azul é tudo ou nada.

Se tudo, vazio de nada,

se nada, pecado de tudo\'.

O vento sul traz pesares

em solo, sonatas, baladas,

réquiem suave de luto.

Estás assim, tão bonito,

vestido de maresia,

em mar de vontades vazias.

Ai!... Mergulhei neste azul,

mergulhaste em tudo e nada.

Em teus mares me afoguei,

em meu arco-íris sonhastes.

Mergulhei em dores, bem sei,

onde de sol não me amaste.

Disseste meio ao vento sul:

\"Nunca mergulhes no azul.\"

Estás assim, tão bonito,

vestido de maresia,

no espelho da travessia.

Mostra-me um só grão de areia,

estrela, em que não me amaste

Pergunta à lua cheia,

às dunas de brancas lembranças,

onde por ti foi plantada,

nossa cruz, paixão de andanças.

Verão, hiato, verão,

juízo em razão e meia,

um era sim , outro não.

Estás assim tão bonito

vestido de maresia,

indo ao sul das profecias

O nosso amor, continente,

já quase iceberg ou ilha,

num sussurro confidente

converte-se em crença e trilha.

Desculpa-me se te agarras

ao barco em que te pus amarras,

onde acorda a insegurança

na corda bamba do vento

entre a dor e a esperança

o azul, o abismo, o alento.

Estás assim tão bonito

vestido de maresia

que em teu dorso se atrevia

sinuosa onda nua.

Perdemos as contas das contas

das gotas de luz da lua

onde o relógio desconta,

à luz da sobrevivência,

fogo emprenhando a terra

num tempo sem referências,

poço fundo de ternura

sexo recorte de serra,

traço de Deus sem rasuras.

Estás assim tão bonito

vestido de maresia

num braço de mar que se abria

Desculpa-me o rechaço

quando o azul quebrou a paz

e fez-se maior que o branco

tocando as bordas do escuro.

No tanto fez, tanto faz

desculpo-te o tempo em estilhaços

quando aos trancos e barrancos

as ondas viraram muro.

Desculpa-me pelo medo

em encantos de Abrolhos

Desculpo-te pelo rochedo

quando azul cegou meus olhos,

n\'outra corrente de abrolhos.

.

Estás assim tão bonito

vestido de maresia!

Eu era Oxum ou Maria.

Vim de um rio esquisito

não sei se sereia ou yara

mas tudo era tão bonito

desaguando em tua seara.

Estamos em outro mundo

em nova cadência de tempo

em tempo de sentir tão fundo

que a arritmia do vento

abriu um azul no espaço,

nicho úmido, regaço.

Acho que nos tornamos

feitio e intenção de abraço

nos mares de amor que entornamos

Estamos assim tão bonitos

vestidos de ventania

azul soprando em irrestritos

verdes mares, pradarias.