ESPELHO DO MAR
Os dedos tamborilavam num ritmo preciso,
Como se contassem os segundos em que eu esperava
O sol nascer no brilho do seu sorriso
Enquanto ouvia a música que seu olhar cantava.
Eu me perdia, me achava, permanecia em transe,
Como se fizesse um pacto com o amor a cada instante!
Não há vínculos mais autênticos que o sangue...
E nosso pacto de sangue me fazia flutuar
Ao redor da lua distante.
Eu me sentia um astro rasgando o ar
Na imensidão do firmamento,
No infinito espaço do meu pensamento!
Estava atordoado, fraco de contentamento
E a vida era uma realização de sonhos perfeitos,
Cada sonho se realizava a seu tempo!
(Até a felicidade, às vezes, é um despeito!)
Ao acordar, o sonho lindo se desfazia...
E voltava a dor, a solidão, a apatia!
A realidade é sempre mais lúgubre e sombria...
É a sucessão de momentos complicados
Que nos arremessa numa agonia,
Que nos engole, se não tivermos cuidado.
A realidade é uma eterna busca da razão,
Que tenta encontrar o equilíbrio do coração.
Encontrava paciência sem compreensão,
Encontrava motivos, desculpas e outras mentiras
Mas, o amor, ainda era uma nostálgica ilusão
Que surgia ante minhas pupilas dilatadas;
Surgia como uma fórmula ocupacional,
Seguido de um registro pessoal.
Quando o desapontamento tornou-se terminal,
Resolvi ver a vida pelo espelho do mar.
Vi que eu poderia ser do bem e do mal,
Sem fingir, sem temer. Era só sonhar...
Eu sorriria aos bons quando fosse prudente
Mas, me fecharia, se assim quisesse meu consciente.
Chegou a minha vez de bancar o ambivalente.
Tampouco agirei como os outros agem.
Seria eu, uma forma dupla de mim simplesmente,
Tentando espantar os fantasmas que me invadem?
Meus fantasmas são lembranças que ficaram
Dos sentimentos que não duraram.
O dia terminou, suas horas já passaram
E, na estante das recordações, os porta-retratos,
Guardiões dos momentos que se eternizaram,
Olham-me como se me prendessem ao passado.
Meus olhos se fecham instintivamente,
Enquanto rolam pela face minhas lágrimas dormentes!
Estar livre quando se precisa de correntes
É como se dar conta de que tudo existiu,
É crer que o passado não é um modificado presente
Que, por ser descrente, meu coração não sentiu.
E eu que esperava ouvir seu olhar cantando,
Posso ver a realidade do meu olhar em pranto!