Águas de Junho (Tragédia no Nordeste)
Turvas as águas aguçam o cheiro da desgraça
Sem prenúncio, não são águas de março
E sem pedir passagem, resvalam inundações
Deixando no sertão um rastro de horror.
Obscenas misturam-se às lágrimas
E já não se sabe do sabor amargo
Pois que a dor lav(r)a-se em pranto
Deságua de olhos esbugalhados
E sem esperança.
Vacila a fé e a oração parece obsoleta
Com furor a natureza varre e castiga
Sobeja a fuga, para quem sabe onde?
Se mais uma cachoeira destroçada lambe a rua
Sob os ladrilhos onde pulsava o canto
Sem improviso vem o medo esvai-se a sorte
Sopro na nuca, cruel bafeja a morte.
Impotente a terra some e ceifa vidas
Nas águas de junho esdrúxulo túmulo
Sequer uma cruz será erguida.
Fátima Mota
29/06/2010