O Muro

Eu construí um muro

Bem ali na minha frente,

E assim,

Olhos só para ele.

Na minha vida

Não havia mais nada...

Eu o enfeitei

Com mármore de Carrara

Com mosaico catalão

E com canções populares

Do folclore de Pasárgada...

Me entreti

Me lambuzei

Rolei de tanto rir

Me limpei.

Corri e ralhei

Por todo seu tênue

Comprimento

E olhei cada tijolo

Cada detalhe

Cada coisinha nele

Desenfeitei e re-enfeitei

Inventei e reinventei

Cada sentido

Para o muro.

Mostrei a todo mundo

O meu muro.

Convidei amigos para vê-lo

E perante ele

Dei muitas festas

E jantares regados a humor

E a vinho do porto

E ao calor das poesias...

Muitas donzelas

O conheceram também,

E rolaram...

Ficou um pouco de cada coisa,

De cada lembrança,

De cada pessoa no muro...

Passado um tempo

Hum... deu um tédio danado

Uma solidão seguida

De um vazio ferrenho

E depois uma comichão.

Apresentei a ele

Drummond,

Charcot,

E até Rimbaud...

Ninguém, porém,

Do muro gostou.

Nem Bandeira

Em cima dele ficou.

Não sabia o que fazer

A vontade foi irresistível

Fiquei de pé

Na pontinha dos dedos

E tive, pasmem,

Que olhar por sobre ele...

Depois disso,

Postado, ah!

A Minha vontade

Foi de prostrá-lo já!