Dai-me

Distorço todas as formas

E torço para o mundo parecer tragável

Tomo mais um trago

E trago mais uma garrafa

Daí-me sede para beber

O tanto que necessito pra poder evitar

Pensar

No que este país me faz contemplar

Guerra fria

Guerra quente

Guerra de interesses

Interesses em guerras

Sem terras sem vergonhas

Sem trabalho, sem querer

Sem perder

O comodismo brasileiro de achar,

Que o errado é o mundo inteiro

Povo errado

Elogiado

Roubando e sendo roubado

E eu querendo esquecer tudo isso

Tentando ficar embriagado

Outro copo

Outras drogas

Preciso

Ainda preciso acreditar

E lúcido não consigo

Dai-me um baseado

Para rir de tudo isso, e esquecer

A morte de Herzog,

O suicídio de Pc

O Renan Calheiros

O Sarney e o PT

Dai-me pó

Para pilhar,

E ajudar a empilhar

Os mortos do morro do Bumba

Moradores do lixo

Do lixo iminente do país em crescimento

Do lixo do senado

Sem nada, a não ser lixo

Dai-me chá de cogumelo

Quero me perder em duelos

No país das maravilhas

País da fome

Do codinome futebol

País da sede

Que tem bola na rede

Daí-me crack

Tire-me desse lugar imundo

Quero um país de heróis

Não de craques

De copa do mundo

Já enchi meu álbum

De políticos corruptos

De povo corrupto

De policiais corruptíveis

De sindicalistas corruptos

Ladrões

Não sei se fico aqui

Mas cá estou

Será que já me corrompi?

Envergonho-me de ti ó pátria amada

Não te idolatro

Pois ídolo só se é ídolo de longe

E te conheço bem

Conheço alguns de seus esgotos inesgotáveis

Eu barata passeando neles

Procurando alimento

Pro estômago e pra alma

Mas nesse esgoto

Quando a alma come e quer vomitar

Mas necessita regurgitar

Ahhhhhhhhh

Dai-me mais

Mais alcatrão, mais nicotina

Cansei de ter bom senso

Num país onde o censo mostra

Quase 50% vive na pobreza

Ou na miséria

Essas propagandas de pessoas sorrindo

Não podem, não podem ser sérias

Sem sorriso colgate

Sem sorriso

Sem dentes

Na boca

Sem alimento na boca

Boca que não fala

Mas grita gol

Comemora com Robinho, Ronaldinho

Já gritou muito com o baixinho

Correr, pintar as ruas

Vestir a camisa canarinha

E torcer para os 11 gladiadores

Se orgulhar, por morar num país tão guerreiro

Deitados eternamente em berço esplêndido

Seus filhos mais abastados

Riem e se embebedam em champagne

E eu também quero um gole

Não precisa ser Champagne,

Pode ser cachaça

Pode ser Pitu

Minha garganta engole

Dai-me cola

Pra não lembrar da Praça da Sé

Dai-me Ecstasy

Quero voltar a ter sede de viver

Quero lembrar como é

Daí-me Daime

Para esquecer essa violência

Fingir que não existe

Uma comédia nesse palco

Daí-me Daime

Quero rir de toda essa piada

E não chorar pela morte do Glauco.

Raflas
Enviado por Raflas em 24/06/2010
Código do texto: T2339673
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.