[Paisagem Noturna]

[... por que existir é incompreensível aos olhos da razão]

Passa da meia-noite.

Acordo de umas quatro horas de sono,

e sento-me na beirada da cama.

Aturdido, sinto a cara amarrotada;

tenho a boca travosa pela secura,

quase mastigo a língua ensaboada.

estático, enquanto olho o nada,

seguro a cabeça entre as mãos

envolvendo-a como se eu fosse

arremessar um globo terrestre.

ponho os pés no chão frio,

dá-se um milagre:

numa suave e verdejante encosta,

há uma árvore solitária,

do porte de uma jabuticabeira

vista por mim, quando adulto.

Pousado na árvore, mas indistinguível à vista,

há um bando de pássaros que trinam

ruídos mil sob a luz frouxa do ocaso.

Há uma alegria incompreensível

na polifonia dos pássaros fundida

à claridade macia da luz mortiça.

retiro os pés do chão frio:

voam os pássaros, vai-se a árvore,

some o sol, vem a noite,

bate-me n’alma uma tristeza sem nome!

Só mesmo um louco diria

que essa paisagem não existe!

[Penas do Desterro, 01h50 da madrugada de 24 de julho de 2001]

Caderno 4

Carlos Rodolfo Stopa
Enviado por Carlos Rodolfo Stopa em 03/06/2010
Reeditado em 22/04/2012
Código do texto: T2298186
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