PORQUE VIVO


Não quero da vida arroubos nem
mais nada extraordinário.
Do chope, o melhor dele gelado
me contenta e esquenta geadas interiores;
Do vinho, o seco me completa,
transmuta a alma e molha meus entardeceres;
Das viagens, longe não me importa
minha Europa pode estar aqui transposta no olhar,
no subir da serra rumo a Gravatá.
Dos amores, não quero paixões torrenciais,
mais que sou meu amor é mais,
mais que tenho não me faltam ais
quando ele foge logo volta
quando volta não me deixa mais.
Das tristezas, o bastante nunca excede
a medida certa do sofrer
fazendo da vida exercício de sabedoria:
quando a dor não vier de noite
pode ser que não venha durante o dia.
Do riso,  gargalhar não libera alma
porque etérea se transporta como boca e beijo
e como faca e queijo, acalma nosso destino
desmistifica sonhos contidos no véu palatino.
Do tempo, tempero faço:
entre a ida e a idade
o fel e a fealdade
o eterno e a terna idade
posto que não se enruga a face
senão pela faceta do atrevido ato de
ser feliz vivendo por um triz.
Do agora os fragmentos são ontem,
não me contem que o leite foi derramado,
que o sol nasceu quadrado,
tampouco que meu absoluto é relativo.
Apenas vivo
Apenas vivo.


Gramado-RS, 28 de maio de 2010.