DOR QUE SALVA

Igual a quem um dia te pariu

Maltratada, por anos e anos

Esteve a viver, penando, a fio

Lutando, a salvar nossa dor

Que te margeia, a causar danos.

Minha primaz pura e bela

Hoje velha, nova, cheia de cor

Lépida igual adolescente

Semi-analfabeta; sem trela

Nos convidastes, e sentes

Nunca, nunca te vi tão linda

Tão arrumada e bem vestida!

Oh! Cidade-Mãe, onde do nada

O pobre vive sua totalidade

Tua paz o deixa livre, festeiro

E o som emanado dos timbales

Como os negros, puro e verdadeiro.

Estou aqui, tantos anos a aplaudir

Cinqüenta, mais quatrocentos

Redondos, a Diva a repetir:

“Num corpinho de duzentos”!

Sem apologia, estamos a sentir

Nunca, nunca te vi tão linda

Tão arrumada e bem vestida!

Teus filhos, só profundo amor

Por ti a lutar, como dantes

Desde o mar a te banhar

Ao núcleo ainda verdejante

Perpetuando o teu valor

Alguns excessos, aqui e ali

Esquecimentos outros, acolá.

Num passado não tão recente

Teu vermelho era sangue-azul

Num sofrer profundo, inclemente

Hoje é quase todo rubro, até Jesus!

Nunca, nunca te vi tão linda

Tão arrumada e bem vestida!

Antes, o negro da escuridão

Enxotado com a luz fulgurante

A emanar de tuas entranhas

Multicor, como o fogo da paixão

A salvar toda dor; a queimar

Por teus filhos mais errantes

Nada mais restando, a recordar

Todos aqueles pecados aberrantes

Sem se deixar sofrer, a olvidar

Nunca, nunca te vi tão linda

Tão arrumada e bem vestida!

Para o velho e rico continente

Como tua mãe, estás a engatinhar

Quase-analfabeta, ainda adolescente

A me fazer sentir, sofrer e chorar!

Acompanhando os reflexos no mar

Vejo o teu humor mudar de cor

E enxergo vida, nas ondas, a espumar

Mas no chocar das pedras, sinto tua dor

A nos unir, no machucar intermitente

Forte, não choras, e diz que nem sentes

Nunca, nunca te vi tão linda

Tão arrumada e bem vestida!

Divina, doce e bela: Parabéns, Salvador!

Sempre justa, estás a rimar amor e dor

O mundo em guerra, a cada ano a adotar

Filhos como a gente, na busca da eterna paz

E juntos vamos, assomar, comemorando

A festejar, do leão da barra, o centenário

Esquadrão de aço também compartilhando

Unidos, a louvar, compondo o teu cenário

Juntos, a lutar por tua almejada maioridade

Ovacionada, aclamada, ó cidade idolatrada

Negros, rubros, brancos, todos a se render por ti!

Nunca, nunca te vi tão linda

Tão arrumada e bem vestida!

RAbreu
Enviado por RAbreu em 10/05/2010
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