BRINCOS

Hoje o olhar encopa dois aviões

Que nunca voaram nos céus da China.

O olho vela a velha chinela

Largada no sótão emundado.

Na escuridão do jogo dos pés

Chora a voz de quem nunca partiu.

Caminho com um coração de aço.

Andar pelo mundo pode deixar feridas

Que a mão da minha mãe não pode sarar.

Estranho qualquer pedra

Que não carrasca um único sonho.

Há um menino passeando sem olhos,

Levado pelos guias nus do indestino.

Há um menino morrendo dentro do menino.

Há um menino morto nascendo dentro do menino.

Carregue meu ombro e veja se pode carregar

Por um minuto a montanha que me deram

Como recompensa por esconder a verdade.

Na cordilheira da minha mão transpira

Uma ambição de roubar uma semana a mais na vida.

Meu coração espera as horas

Para planejar uma grande fuga e não ter mais que

Vestir smoking na festa dos homens.

Olhe a fonte me revelando uma ponte

Que me levará a uma fonte.

Se quero andar, a estrada é tapete de esporas.

Beijo o que sobrou de Atenas e aceno

Para a minha imagem resumida num espelho de bolso.

No bolso de sacolejar o resto

Daquelas crianças que esperavam

Com o carrinho escondido que o tempo

Roubasse-lhes a inocência.

O portão do meu caderno de desenho

É o maior obstáculo a ser vencido.

A cidade corre dos seus carros e esconde

De suas gentes e vermes.

Mas ainda há um espaço guardado na vida

Para quem carrega uma mochila nas costas.

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 01/04/2010
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