Escrevo assim como quem olha de soslaio
De tanto mirar é que vou errando cada vez mais
O que não sei de Fernando Pessoa ignoro de Manoel de Barros
As sonoridades plácidas e concretas de dizer nada ou muito
No pouco que não se fala quando não se quer dizer
A inspiração assim de esguelha só enxerga o lado torto das coisas
Não me peça que seja sóbrio com meu cérebro
E nem me peça que seja puro de um coração que já amou tanto
A alma, essa coisa que fui aos poucos deixando pelos cantos
Largando por aí nos atalhos enquanto recolhia as asas
Eu sei que vôo, e sei que voar é mais que andar ou sonhar
Ou tudo a mesma coisa a se derramar a cuspidas de poesia
Até o dia em que vomitar uma obra-prima e não digerir mais nada...
 
Meus sonhos são assim meio pau-a-pique
Equilibrando-se nas pernas magrelas sobre um rio caudaloso
Os momentos palafitas erguem-se dos fenômenos
A realidade não é mais do que um escombro de si mesma
Meus desejos estão sempre a esperar outras chuvas
Vou semeando o que não realizo na entressafra
E no que olho de dentro para fora no entreaberto do olhar
É perceber que não há mais nada do que se pode ver de fato
Então vou viver assim como quem se larga ao sabor do vento
As velas enfunadas, os medos enjaulados, as perguntas caladas
E essas palavras rasgando em mim por mim através de mim
Sangram e doem se tem que ser assim de ser ditas
De uma vez por todas toda vez que me visitar a Poesia
Essa mesma que sempre me visita anunciando a outra...
Marcos Lizardo
Enviado por Marcos Lizardo em 31/03/2010
Reeditado em 08/08/2021
Código do texto: T2169573
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