Paradeiro
Estou num ponto livre;
É entre o sim e o nada que me encontro,
No delicioso e frágil limiar que faz doer no peito
Um calor ardido que se gruda nas narinas
E pula pra fora do corpo, como que expulso.
E é como gente que vomito o opulento doce do prosaico,
E abnego e abdico do comum, da norma, do regimento burro
Que orquestra os naipes da vida, como um todo – como um nada.
Da consuetudinária, me livro também, e do livro
Me livro.
Estou num ponto-nulo;
É entre o tudo e o não que eu me encontro,
E o paradeiro eu sei, mas não me acho,
Como se por sub-repção me houvessem arrancado
A autoconsciência,
E me houvessem lançado no lugar-comum,
Num lugar-comum, qualquer lugar onde possa haver
Um céu para não ver, um chão para pisar e correntes a me prender
À terra.
Estou num ponto-parágrafo;
É como ter firmado um quase-contrato com uma ignorância quase-consciente
Para se manter em mesmo estado
Em simples-tato, status quo
Cego de olhar e de pensar
Surdo de ouvir e de pensar
Morto de viver e de pensar.
E houvesse uma barreira entre o medíocre e o refinado,
Intransponível;
Inexorável!
Uma inevitabilidade tola
Anti-contumácia, anti-persistência
Anti-existência.
Estou num ponto que não é final.
Onde não há conserto, nem erros
É feito um vazio imenso que engole o tempo
E que eu movimento por dentro de mim
Como fazendo pouco de mim mesmo,
E é entre o mais perdido e mais abstruso, que encontro metade de mim
E rolo insone pela incontestável hemicrania
Justificada pelo seu próprio sentido.
Só sou metade de gente.
Só estou metade de algo.
Estou num ponto, onde não há ponto.