A pomba negra
( A Meluka, Genny e Atcha )
Na imaginação da gente
há um pássaro que voa solto
pairando por cima de nossas cabeças.
O seu vôo lembra ora o sonho
que se tem da liberdade, ora
a liberdade encarrada num corpo livre;
Ora o gesto do ser que vive
numa pomba solta no espaço.
Aquele pássaro era de uma leveza
das quais podemos chamar estranhas:
não tinha o colorido das outras aves;
nem o branco que outros louvam.
Tinha sim o negro de suas penas,
o escuro de suas patas, preto
da cor do carvão mais forte;
tinha também a capacidade de acender-se,
de quimar-se por dentro e por fora
com a força de uma brasa viva.
Porém mais forte era seu impulso
e seu desejo de alçar vôo.
O pássaro cortava o céu
como uma lembrança corta o tempo;
como o próprio tempo corta tudo:
da lembrança à realidade da ave
envolvendo tudo em seu vôo.
A ave voava num direção própria
é somente ela entendia seu rumo
e o destino e não-destino
que ele levava-a, caminho aéreo
que só os seres livres entendem.
Tal qual ser alado por excelência,
sua imagem fazia os olhos
voltarem-se ao alto, buscando
quiçá, a sensação de contemplar
algo que nos seja superior
mas que tenha algo em comum a nós.
O pássaro pairava como mensageiro
da paz esquecido, em paz
com sua negridão opaca
mas em luta ubíqua com
o todo que o cerca, até
na solidão de seu vôo:
em luta, portanto, com a queda.
Tal qual, ainda, a sensação de ar
em seus pulmões, a distancia em
sus olhos,objetivo em suas asas
e a ausencia sob os pés;
o pequenos ser alado extendia
a plenitude feita num bater de asas
e a percepção de que tudo é vasto
até nas criaturas em que lhes é
permitidp planar sobre as outras
Ainda assim a distância em seus olhos
parecia dar-lhe a sensação
de se sentir pequeno; na verdade
voar sempre foi algo perigoso,
mas tão ineviatavel quanto
a arte de poder e ter que viver.
ainda assim o vazio baixo os pés
parecia confrontar a presença do ar
dentro e fora de si, como explosão
anunciada e, logo após, ocorrida.
No entanto esse verso escrito no ar
é o mais sincero porque flui
com o atro do pássaro negro
Tem esse pássaro algo de herói?
ou será que é seu vôo identico
ao de todas as aves?
Na verdade o fato do vôo só
é importante dependendo do foco
que o intelecto de quem olha dá.
Dir-se-ia, é certo, que não há
nada de extraordinário num pássaro
poder voar, sempre foi assim...
mas o espetáculo da vida nos dá
sempre grandes surpresas.
E não há heroismo maior
que ascender-se contra a queda:
ver a belelza aérea que se chama vôo;
ver desenrolar-se abaixo o tapete
da distância, a clareza da vida
mesmo que um pouco apagada.
A multidão das formas, mesmo
que em singular destino;
Cortar o espaço e o tempo
como é do próprio destino.
E a clareza dos fatos
na escuridão da pomba negra.
Que corta o ar como o tempo a tudo
pairando a vida no vôo hercúleo de fênix