[Inquietação]
Sou um inquieto na vida...
Eu sou rude... e sei-me:
Eu sou rudimentar!
Queria, mas queria tanto
dizer algo além de nada,
queria ter palavras como
imantação de serpente
para pássaros livres;
mas "a gente" nunca diz nada...
E se dissesse, serviria pra quê?
Verso trivial, escrito
à hiante boca da noite,
só para passar o susto
de ler os olhos de um pássaro ferido:
"No deserto das nossas existências,
há um jardim onde viceja a Relação,
este ser alado maravilhoso dotado
de uma asa minha, e a outra, tua."
Inquieta-me pensar que um pássaro
assim formoso não mais possa voar,
pois tem as asas desconjuminadas
por feridas de abandonos...
No caso, as aspas servem apenas
para realçar a banalidade...
Eu tenho o gosto de olhar
pela fresta do biombo do Banal.
Mas para voar comigo, é preciso
ser essencial, sem sobras;
ser simples, sem rodeios;
gostar de ver o formidável esforço mecânico de um formiga;
ter uma inquietação que fala com a minha!
[Penas do Desterro, boca da noite de 13 de março de 2010]