BESTAS FERAS DO MUNDO
Besta encarnada, em forma de gente!
Boca falante, escancarada, cheia de dentes
pontiagudos e devoradores do que há de melhor
Melhor do lixo enlatado, ensacado, encalhado
encarquilhado e preservado em formol de defundo
Podre, pobre presunto!
Besta, em tu tudo mente
Desde o cabelo às unhas pintadas
Camisas de time, sonhos na vitrine,
na segunda começo um novo regime!
Para depois engolir toda a lavagem
De cara lavada, orando ou rezando,
babando nos sofás de domingo
Esperando o time ganhar,
carrinhos correndo na tela
gordura no corpo e a testa suada
Abestalhada, besta ajoelhada, olhando para o céu
o sonho da besta é um dia quem sabe
um dia ser besta mundial amada
E as bestas pensantes, que pensam pensar?
Pensar é difícil, mais fácil é agir
e, além de tudo, é preciso trabalhar!
Ficam espantadas em constatar que são ausentes
mesmo assim presentes, assim frente à frente
Expressão forçada, olhos fundos, não de profundidade
mas de retardo infantil, bestificado, faminto
auditório, platéia...
Alcatéia
Besta, e o que é que resta?
O que é que em tu sobra de mais verdadeiro?
Simulação até para limpar o cu no banheiro?
Atuando alegria e contentação, besta
tu não percebes que tudo não passa de encenação?
Tudo o que sente é furado, vaza, se desmancha no ar
Toda essa tranqueira cara, todas as cores no rosto
Toda essa mentira construída em sua vida
e que se esforças bestamente para acreditar
Toda a certeza ignorante, com um ou mil livros na estante
Não importa, besta nascente, eterna e senil
Ignora, talvez o mais importante, por isso ignorante
Querida besta imbecil!
O que é que esconde em seu peito vazio,
entulhado de formas fáceis, do consabido e do óbvio
das propagandas do intervalo da novela
da camisa amarela da amada seleção
entulhado de novas antiguidades inéditas e empoeiradas?
É assim, sempre besta preocupada,
porque mente desocupada é mente que pensa
nas mentiras que se conta para si mesmo
Que se pergunta o porquê do mesmo
que se questiona sobre os excitantes marasmos
que se pergunta se no prazer há só espasmos,
se há só agitação e, se por acaso,
tudo não passa de ilusão
Besta fera raivosa, asquerosa besta!
Tu és uma, tu és única, tu és mil, tu és milhão
Há tantas bestas, tão concretas em sua eteridade
Concreção é necessidade
para aqueles que mal sabem o que são
Âncora para se manter no chão
O que existe são os prédios
os comprimidos de remédio
carros e pacotes de viagem fechados,
compras em supermercado
Besta, tu não sabes
mas moras num caixão