ENTRE MUROS
Caminho entre muros há muito tempo, calado,
esperando um silêncio que não se faz presente.
Há palavras riscadas com pedra, nos rebocos.
Paixões violentas gritando mais alto
que os gritos dos musgos verdes rasgados,
expondo entranhas de pedra crua.
Há lixo neste chão de incongruência,
neste percurso lento, detalhado, por entre muros
demasiado longos para serem rua.
Mas são demasiado perfeitos , demasiado cuidados,
demasiado altos e sem uma paisagem circundante
para onde se abram em ânsias de espaço vital,
para serem estrada. Não são.
Por detrás adivinham-se casas, ruídos, cores,
que talvez os muros defendam desse lixo,
precisamente.
Ou talvez os muros sirvam apenas
para que a rua se saiba rua,
ou a estrada se saiba estrada,
e para que os passantes se saibam indo,
parte de um fluxo acontecendo,
não desse mistério preservado do lado de lá,
ao alcance de uma mirada indiscreta
que ninguém arrisca,
como se os muros marcassem limites
bem mais vincados que os de qualquer rua.
Março 2010