AS ASAS DA FORMIGA
Amiga,
a qualquer hora és bem-chegada
mesmo se não saibas bater à porta.
Passageira,
és tão bem-vinda qual a louca intensidade
dos pingos da chuva esbugalhando o chão.
Companheira,
chegaste batendo a cabeça e desgovernada
transpassando a tela, a luz, a estrela, o zinco.
Em busca de um torrão,
num vai-e-vem, do açucareiro à lâmpada,
já te sentes dona da casa
fazendo cocô na toalha
e voando, e voando sobre os cômodos.
Em busca de luminosidade,
nesse vai-e-vem estonteante: gira,volta e cai;
bem íntima da claridade
bocejas para dormir
ao lado escuro da cama, já hipnotizada.
Cedo, sei, perderás as asas!
Mas não faças esse zunzum esfuziante
sobre o prato cheio d`água sobre a mesa,
pois, se caíres nele, amiga,
ficarás nua de vento
e perderás a vontade de ficar e ficar sem voar.
A noite é uma armadilha
que dorme de luz apagada.