MEMÓRIAS NORDESTINAS
eu Sou mais eu!
bem mais forte, pés rachados,
tentei
ser um cosmopolita.
[desviolei o sertão]
falta faz farinha no bucho
a água da cacimba
o angu com pouco sal
da minha mãe,
da mãe dos meus sete filhos
[uma Mariinha]
que – às pressas – vem para as bandas de cá,
atrás dos meus pés ainda rachados,
na tentativa
também de ser cosmopolita.
[malas carregadas]
falta do curió cantador
da rapadura-puxa
dos espinhos do mandacaru
do meu pai
de pés mais rachados que os meus
[‘Seo’ Luiz]
que – por carta de selo – me contou num repente
que ficará por lá nem que o quengo rache
qu’eu pare de insistência
pr’ele vir pr’uma terra maior que o chão.
[desviolei o sertão]
falta da cachaça de cabeça
do cuscuz de tapioca
do capim-santo, do gado magro
dos inchadinhos barrigudos
de pés nem tão rachados quanto os meus
[Zefa, Zeca, Zilú, Zica, Zoião, Zito e Crispiniano]
que – ainda de dó no chorar – querem vir logo para cá,
na cidade onde os beiços tremem,
matar para todo o sempre
a saudade que cresce e fica n’agente
nós Somos mais nós!
disse eu à Mariinha curando seus pés do frio.
Vamô voltá pru nosso chão?
eu Sou mais eu!
[repensei]
todo cosmopolita é um bom filho-da-pêga!
[não desviolo mais o sertão]