O CHÃO QUE NÃO É TEU
Vai, menino, que esse mundo é pequeno para nós dois.
Pega tua trouxa, teu violão e cai no mundo.
Esquece meu endereço, meu apreço, meu desprezo.
Esquece minha cara, minha tara, minha pele.
Esquece minha raiz, minha matriz, meu arreio.
Aqui não há mais ar para você respirar.
Aqui não há mais terra para acarinhar teus ossos,
aqui não há mais memória para vasculhar tua vida.
Vai embora, já vai tarde, vai!
Quando acordar, não quero mais sentir que um dia
tua sombra passou por aqui.
Esse chão não é teu, nunca foi e nunca será.
Vai, menino, vire homem em outros sertões,
vai virar fuligem em outros quinhões,
vai virar contrapeso em outros sermões.
E, quando quiser voltar, a minha porta estará destrancada,
a mesma porta que você maltrapilhou com tanta gana e fé,
a mesma porta pela qual passaram todos nossos sonhos.
Até um dia qualquer, menino.
E não olhe para trás.
Nunca mais olhe para trás.
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