SETE SONETOS PARA A LUZ
1.
Luz, não entras nesta cela, onde o destino me encerrou?
Horas não passam até que venhas ter comigo.
Ocorre que quando chegas não consigo
Dizer-te que meu coração, desde cedo, te amou.
A mente delira com montanhas e mares e viagens,
Enquanto caridoso ajudo as gentes mais distantes-
A meu lado, no Oceano, também são navegantes
A Timidez e o Decoro, dentre outras imagens.
Entras e de tudo me esqueço, um sorriso nasce do abandono.
Tento lembrar-me de um poema, um conto, noites sob a lua...
Mas, indefeso, caio em profundo sono.
Sou, por mim, deste modo, tão desconhecido
Que tua presença musical e suave
Encontra-me sem rumo ou estrela, náufrago, perdido.
2.
Luz, neste ar do norte, azulejado e límpido
Vens de repente, com teu modo alto e sublime.
Mas, saibas que o sentimento que me oprime
Tão pungente é, quanto é o lume solar, vívido.
É como uma guerra diária em vales tormentosos
Contra forças que em muito me superam
Incertezas, dúvidas, prantos que me esperam
E que me atacam sem dó, vis, impiedosos.
A carne dói, e os ossos, batidos, estremecem.
Mas o coração e a mente, com as cargas repentinas
Por pouco não dão retirada, por pouco não desaparecem.
Energias me surgem, sonhos de um mundo renovado
Em que caminharemos, entre os lírios do caminho,
Felizes, para sempre livres do mal e do cuidado.
3.
Luz, bem vejo que estás, assim, cansada!
De meu desejo de te amar também padeço.
Meu não-ser me acusa, dizendo que te desmereço,
Mas o ser repete hinos de alvorada,
Dizendo que tenho muitas qualidades,
Que um ideal possuo, que ainda não morreu...
Aquele que herdei dos poetas do himeneu,
Último suspiro de gregas e latinas verdades.
Como eram grandes estes homens que escreviam
Sobre conquistas gloriosas e altares em chamas.
Sobre damas e dragões e os dramas que viviam!
Sei que estás cansada, e como eu quereria ter-te
A meu lado para te narrar com maestria
Eventos deste porte, histórias para divertir-te.
4.
Luz, banhas as árvores que surgem do penedo
Neste mundo transitório tão carente de belezas,
Batizas os frutos do meu amor, e, se desejas,
Beija-os com teus lábios, desde cedo...
Para que cresçam fortes e sutis, pela lua divinados,
Embebidos de néctar, transparente poema
Que a Natura distribui aqui e ali em lida extrema
Contra as forças dos homens, brutos, insaciados.
Eis que quando da maturidade sopram os ventos
Caem os frutos, abre-se da terra o doce seio...
Sementes brotam às dúzias, aos centos.
E daí recomece o ciclo que nunca termina...
Início e fim- um nos braços do outro...
Um brilho fulgurante nas plagas acima.
5.
Luz, que habitas os vitrais das romanas igrejas
E fortalece os corações dos jovens que crêem
Fazendo-os partir para longas pelejas
Com remoçado ideal a favor de todo o Bem,
Não te esqueças deste pobre poeta sem espada!
Não te rias de minhas frases em estilo antigo.
Pois escrevo com o sangue desta harpa inolvidada-
O coração, um pequeno deus que carrego comigo.
Ele brinca por espaços sem limites ou fronteira
Percorre vácuos, o éter, corre onde queira.
Uma coisa só nele é constante:
O amor, que é a fonte daquele calmo jardim
Em que bebem a todo instante
Poetas, missionários, guerreiros, enfim.
6.
Luz, que fazes quando desce a melancólica noite?
Quando teus poderes, pela treva diminuídos,
Repercutem lentos nas florestas e campos protegidos,
E se escuta do vento o morno e perfumado açoite?
Nestes momentos me vês de súbito a escrever
Da solidão que sinto à luz de velas-
Tão grande quanto a das primitivas estrelas
Quando o universo acabara de nascer.
Que fazes, vagando pelas noturnas vias,
Quando aqui a meu lado poderias dormir,
A ouvir cantos sobre velhas cavalarias?
Espero-te, enquanto ainda tenho forças...
Enquanto o Sonho não me tolhe a visão
Da bela carruagem em que repousas.
7.
Luz, já nascestes naquele enevoado oriente?
Te digo isto enquanto ainda dormito.
És um sonho ou não és, divino ente,
Que como os números tendes a infinito?
Aqui, neste humilde e acolhedor recanto,
Vivo a contar areia e palavrinhas coloridas
Que descem por um relógio de vidro e divertidas
Caem neste papel uma a uma por encanto.
Ah, que sou um poeta e matemático...
Lembres de mim, que ainda durmo, ó ser distante,
Que amo o desmedido e o fantástico.
Aguardo em breve o teu sinal gracioso
Nas nuvens que se incendeiam lá no Leste...
Sonho e por teu beijo estou ansioso!