PESO
Há tempos sonho com a fé de que o cansaço
que me aflige seja o mesmo que castiga os outros homens.
Esses homens que na rua desnudam o peito
pegam boi brabo pelo chifre
e riem da morte. — É deles a noite.
Esses homens lustrosos de sol
edificadores do mundo, graças a eles, sem o perceber, sobrevivo.
Sobre seus alicerces caminho, mas logo me canso.
Atrás de seus calcanhares, progredimos.
Leite, pão, carne, lençóis limpos e quentes
e a vida já não é mais tão desastrosa, pesada e trágica.
Mas amparado em seus ombros de titãs, carrego algo
inimaginavelmente mais pesado.
Sabe-o o talo das flores, a sustentar suas corolas
com as pétalas e sua gota de orvalho. Sabe-o o caule dos cogumelos
as asas da mariposa que transportam o necessário pólen.
Sabe-o a mão do vento que conduz a pluma
dançantes folhas secas, um fio de cabelo, o mais mínimo grão de areia.
Há tempos carrego algo mais pesado que a asa de uma esperança.
João Lima
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