O TEMPO DA BOA IDÉIA

para completar cinqüenta e um anos de idade,

sem nenhuma precoce senilidade

ou síndrome do “já era”,

necessário é cuidar da sua própria vida

e despreocupar-se com o quintal do tempo alheio.

aos cinqüenta e um – de idade –

boas e más lembranças hão de sempre dar o que pensar

como no dito da vovó quando dizia:

“Galinha gorda será sempre a galinha do vizinho!”

para completar cinqüenta e um anos de idade,

com a pele qual tinta de primeira demão

ou corpo aos suspiros,

necessário é fazer o mínimo de exercícios,

não dar a cara à plástica ou abusar do esforço físico.

aos cinqüenta e um – de idade –

bons e maus traços nas linhas do tempo escrita na face

estão na carta escrita das adegas:

“Nenhuma uva será definitivamente vinho ou passa!”

para completar cinqüenta e um anos de idade,

o branco não será a cor dos esquecidos

nem o negro a cor da solidão,

necessário se ter noção dos altos e baixos

sem o vai-e-vem das idas e vindas em pura imaturidade.

aos cinqüenta e um – de idade –

bons e maus passos já foram dados com unhas curvas

como contou-me um Vulcabrás colegial:

“Sapatos que dão calo aos pés ficarão acalcanhados!”

para completar cinqüenta e um anos de idade,

tem que abandonar todas as Iramaias

e sempre ir mais à Bahia,

para comer efó feito com folhas de taioba

muito leite de coco, azeite, dendê, feijão fradinho. Natural!

aos cinqüenta e um – de idade -

bons e maus regimes foram provados no sobe-e-desce

das ladeiras cheias do cantar de um povo a viver:

“Quanta beleza brasileira há no pé da Ladeira da Preguiça!”

para completar cinqüenta e um anos de idade,

muitas velas foram acesas para apagar

defuntos maus-olhados

com a mesma chama de quem nasce para soprar

caixas de fósforos em brasa que ainda teima em queimar.

aos cinqüenta e um – de idade –

boas e más notícias de noite servem de alento

aos sonhos quem até por sono peca:

“A trepada inesquecível, o pau-de-mijo, a amante agora amiga!”

para completar cinqüenta e um de idade,

esquecidos devem ficar os feriados

e todas as consultas ao doutor,

as fardas já aposentadas e as árvores sem raízes

serão mais importantes que os numerais em par descritos

aos cinqüenta e um – de idade –

os bons e os maus amores são tão verdadeiros

quanto um ano-novo com calendários de mulheres nuas:

“Nenhum encontro é encontro sem ter um passado bem marcado!”

para completar cinqüenta e um de idade,

preciso é ter dado rabos-de-arraia de capoeira no tempo,

garrinchar com dribles ousados

e viver muito mais, muito mais que antigamente,

sem se importar com um novo futuro, ser mais irresponsável

aos cinqüenta e um – de idade –

os bons e os maus vestiram-se até de fraque,

enquanto shorts e camisetas falavam do guarda-roupa:

“Abaixo as meias, os nós de gravata, os cintos! Moda de araque!”

para completar cinqüenta e um de idade,

desnecessário será apagar os numerais fingindo-se um e cinco,

não quero comer bolo fofo, beber vinho escondido

nem expor-me ao extremo do ridículo:

Uma cachacinha? Boa idéia!