Gramatiquice

Você fala, mas todos nem te notam,

Você vê-se perdido, ilha deserta,

Tão perdido, na vida não acerta.

Não se sente porque não se conota.

A palavra do céu não se imagina

Mal usada por bocas de tormento,

Ministrando malícias como alento,

Pesadelo nas bocas mais caninas.

Vejo coisas na casa branda e leve

Contornando de graça esta estrutura,

Esse prédio de mármore que breve

Nos desvenda sem cor certa clausura,

Também gélido e pálido descreve

Nossa falta vivida de cultura.

Separando-se a roupa que não chora

Da tua boca, se percebe de verdade

Que lugares sem luz e sem auroras

Não completam com fé toda cidade.

Veja, vidas seguindo para fora,

Para fora dos carros de vaidade,

Buscam formas diversas pro Agora,

Perseguindo na rua a santidade.

Sem segredos de ferro ou de gemidos

Circulamos sem língua na desgraça.

Tantas máculas mancham os sentidos,

Que passantes com medo de ameaças

Se colocam nos quadros produzidos,

Todos são caçadores ou são caça.

Corpos queimam nas frases dos senhores

Da palavra sem pena dos sem voz.

É pecado falar com dor nas dores,

Reclamar pela morte dos que a sós

Morrem mudos de fome ou faladores

Quando falam tão mudos para nós.

As palavras de ferro nos teus dentes

Calmamente circulam na obediência.

Os fantasmas, de chofre, em penitência

Vão mostrando tuas máculas na mente,

E te deixam sem voz nem eloqüência.

A verdade tem asas de anjo lindas,

E tais asas são bocas com Fortuna,

Mas mentiras são sombras como se inda

Não existissem mais corpos nas colunas

Do pensar pra falar de esquisitice,

Um falar que trará gramatiquice.

1 e 2 de dezembro de 2009.

Ranieri Basílio
Enviado por Ranieri Basílio em 09/12/2009
Código do texto: T1969161