Espera

Sinto findar-se mais um dia

Cai a noite e não mais me acolhe

Vago, perdido nesta euforia

Na quimera de que a vida transforme

O pouco que ainda tenho de humano

Num ser que possa ser compreendido

Ou que não seja abjeto e mundano

E siga por sua ignóbel vida incontido

Esperar finar-se não é para mim

Sinto que é cruel ficar recordando

Que a cada dia está mais perto o fim

Só embarquei na vida a ele esperando?

Não é possível, isso seria nefando

Passar pelo mundo com esta certeza

De que nada ficará por onde ando

Na substância não existe beleza?

No espelho assisto a vida findar-se

Como estivesse de fora dela mesma

Fosse somente o reflexo que passasse

Como a alegria e a minha própria tristeza!

De pressentir que esse momento acabe

Temer que a vida na verdade nada valha

A não ser pelo risco que sempre me cabe

De andar equilibrado no fio da navalha.

Tentando não ser abatido qual a caça

Que foge do seu incansável algoz

Esse a persegue pelo tempo que passa

No fim trazendo, somente, a morte atroz

Cruel, nada mais a ela interessa

Que sentir que é a dona do destino

Mas se para mim parece ter pressa

Procuro ter calma, viver sem desatino

Senão acabo por facilitar sua meta

De levar-me para o outro lado da vida

Somente assim deixo a forma concreta

Quiça a passagem não seja tão dorida.

Brasília-DF, 13 de novembro de 2009.