DIÁSPORA
Fui esvaído do etnocentrismo cabalista
Sendo transplantado em terras estranhas
Negociei com as culturas para sobreviver com a diferença
Fui mercadoria do porto exportada
Fui carne de primeira com emblema de segunda
A alimentar uma nação inteira
Cortaram-me o cordão umbilical,
Mas não conseguiram arrancar o meu DNA
Nos meus cromossomos, a ancestralidade grita alto
Hospedei na minha história uma cultura diferente
À minha tradição sou a ela recorrente
Nas trocas e intercâmbios,
Meus bens simbólicos atravessaram o atlântico
O blues, jazz e o samba são herança
De uma cultura milenar
Fui ferragem e ferreiro das minhas ferramentas
Para minar as prisões das quais me oprimia
O navio negreiro não trouxe apenas massa muscular,
Pele negra, lábios carnudos, cabelos de pixaim e coisas e tal.
Trouxe neurônios...
Trouxe a alma de um povo, o coração.
Amarraram-me os pés e as mãos,
Mas nada puderam fazer ao meu coração
Que continua vivo a clamar por justiça.