PERIGO MORTAL


escrevo, agora, esta missiva, meu caro confessor,
creio eu que minh'Alma se acha em perigo mortal;
por ser um das gents-de-arms, causador de temor,
fui designado pelo Rei para guardar o Palais Royal;

de ronda estava certa noite, que se fazia um negror,
e soprava um vero vento, prenunciador de temporal;
a certa hora, ouço vozes se altercando num clamor,
e a porta maior do Palais se abre com ruído infernal;

dela sai a correr uma Mulher que me causa estupor,
percebo que é a Rainha, envolta num branco avental;
e atrás dEla vem um homem gritando feito um horror,
vestido em cardinalícia cor, empunhando um punhal;

a Mulher cai aos meus pés, dali me olha com pavor,
suplica que a salve, que dEla arrede a Sua hora fatal;
saco a minha durindana, enfrento o Seu perseguidor,
que erra o bote dado em mim, num momento crucial;

reconheço, outrossim, o Cavaleiro de Richelieu, ó dor,
que tenta matar a Rainha de França, feito um animal;
após nova tentativa com o punhal, derrubo o malfeitor,
enterro, em seu peito, o afiado aço num golpe casual;

*****

eis-me detido nesse calabouço, de inacreditável fedor,
aguardando minha hora de enfrentar o julgamento final;
após a confusão, acorreu a guarda desse nobre traidor,
que carregou a Rainha prá longe, me prendendo, afinal;

não morri ali por que fui reconhecido pelo real Ouvidor,
que me vira, e correra, rápidamente, para aquele local;
mas sobrepujado por muitos, chamou-me de acutilador,
e mandou-me para a prisão, e lá na mansarda cardinal;

sinto, na minha consciência, e qual demônio inquisidor,
uma questão inarredável, tal qual uma dúvida primordial:
nada deveria ter feito ao ouvir aquele apelo comovedor,
da Dama real, ou deveria ter matado o insano cardeal?

PS: já saiu o veredito: fica o dito pelo não dito;
       prá uns sou maldito; prás outros, bendito!


Moacir et Selena 2005
brilhe a vossa LUZ!

mes dammes et messieurs: D'artamis pour le vis-a-vis!