Os Dois Negros

Se o blues faz o coração rasgar de melancolia

O samba pode fazer o morro descer em alegria

E júbilo! Do blues que guitarreia lindas melodias

E tristeza! Do samba que se corta com navalha fria

Majestade, da lavoura de algodão em agonia

Soberano, tu és, acorde do sofrer da minoria

Da favela, Missisipi, do Rio, na metrópole ou na Bahia

Em lamentos, em desespero, preconceito e antipatia

Tinha muitos aos dois negros que viajaram em sintonia

Navegando, trazem gritos tortos que despertam simpatia

Dos que hoje querem morrer, querem amar, mas não a apatia

Fato é que hoje sambam juntos, mesmo à nota mais sombria

Juntando terras, muita vez tão distantes

Que sofrem, que cantam muita vez tão parecido

Puxa o arado, sobe à cidade para gritar tão forte

E é abafado por buzinas violentas, afasia

Toma conta por instantes, até o próximo solo estesiante

Que ri de si próprio, da malandragem que se pensa esperta

Mas inteligente a entender os mistérios do coração batido...

E remexido, sacudido, fuzilado e renascido

Na festa do morro, na roda de acorrentados

Que se não as rompem, com elas fazem bailado

Que se não liberta, contagia, em eloquencia

Qualquer cor, qualquer ritmo, mesmo que por vez em malemolência

Gritam todos, afinados na mesma loucura

Pois só quem ri de dor sabe bem o que procura