Era uma vez
Era uma vez
Alguém que era muito feliz,
alguém que andava descalço,
e se sujava na terra, adorava minhoca,
e tomava remédio para vermes e resolvia tudo.
Alguém que abraçava todo mundo,
beijava muito e adorava sentir cócegas
para rir até dar dor de barriga.
Era uma vez...
Alguém que colocava barquinho de papel
na poça d'agua, e nunca foi contaminado.
Se ralava todo no ping-pong, descia a ladeira de patinete e
e quando quebrava a perna adorava mostrar o gêsso e pedir para os amigos assinarem o nome,
alguém que andava de patins e bicicleta, caia e levantava rápido.
Alguém que sempre metia o dedão no bolo
e raspava a forma da massa de bolo de chocolate,
Era uma vez...
Alguém que ficava acordado até não aguentar mais, só para pegar Papai Noel colocando os brinquedos no quarto.
Alguém que detestava óleo de fígado de bacalhau, e amava algodão doce.
Alguém que bricava de casinha na varanda, andava com as roupas do papai e o sapato da mamãe, jogava bola na chuva, se pintava de rouge, jogava bolas de gude, brincava com pião, carrinho, boneca, bola...
e nunca havia escutado falar em gays.
Era uma vez...
Alguém que catava as jujubas verdes
e adorava contar vaga- lumes.
Alguém que comia doces e nunca engordava, até porque nunca se preocupava com o próprio peso, e não sabia o que era anorexia ou obesidade.
Alguém que chamava o amiguinho negro de "Feijão", e ambos nunca haviam escutado falar em racismo.
Alguém que brincava de mocinho e bandido e não sabia o que era violência.
Alguém que brinvava de faz-de-conta e não sabia o que era droga.
Era uma vez...
Um tempo,
onde não tinha criança na rua abandonada,
machucada e suja...
Esse alguém que um dia cresceu e aprendeu
a usar revolver de verdade, comandar guerras e fazer abortos,
andar na rua e não ver a fome, o abandono e a miséria.
Mas Deus é sábio...
Outro alguém também cresceu e ainda lembra de tudo isso
e por isso mesmo brinca de verdade de ser feliz.
Porque Deus equilibra o mundo, e oferece livre arbítrio, de verdade.
Augusta Melo
Rio de Janeiro
LDA 9.160