Lira cantada à moda antiga

Dois vestidos azuis

bailando nos ventos...

... meias e calcinhas

estendidas no caos.

A vida cotidiana depen-

durada com prendedores de roupas.

O varal que meu pai

improvisou. A vida no subúr-

bio ceilandense não era

propriamente

um quadro de Degas

suspenso na parede

embora o ar parecesse mais

leve.

Roupas bailavam

Sorriam no caos

Enquanto dois

meninos suavam.

Mas é tarde

quase noite

e contemplo, da rede, cober-

tores bailando nos ventos.

De repente esse cheiro

gostoso de sabão em pó.

Esse amaciante. E a vaga

lembrança de uma tarde que

ficou dentro de outras

tardes, de outras tardes azuis

em nosso quintal. De repente,

em algum lugar do passado

uma bola tingiu de lama o vesti-

tido azul de minha mãe.

Uma nódoa no vestido azul

de minha mãe. A bola que

chutamos no quintal. O vestido

azul de minha mãe. A nódoa.

Uma surra inesquecível que os

anos não trazem mais. Uma

nódoa. Uma triste nódoa

no vestido azul de minha

mãe. Ai, mas que saudade

não tenho da aurora da minha

vida! Das doces tardes onde

roupas bailavam no ventos,

das doces tardes parecidas

com as bailarinas de Degas

e cujos os anos

não trazem mais!

***

Alex Canuto de Melo
Enviado por Alex Canuto de Melo em 30/09/2009
Reeditado em 02/12/2010
Código do texto: T1840656
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