Da janela de repente uma paisagem do México
Uma noite quente de um filme que não vi
As luzes a saírem das janelas
Calor a me aquecer o sangue
Mulher morena à espreita do amante
Roupas brancas, grande decote, seios fartos
Sorriso de muito brancos dentes
Olhar de felina como quem espera e vigia
Seria por mim? Tolo sonho se eu é que espreito
E me entrego a esse devaneio na noite de verão
O calor e seu bafo quente
A cerveja na lata, a cachaça no copo
O diabo no corpo, a cena na mente
Entrar por sua janela, eu seu amante
E me fartar de amor deliciosamente
Quando de repente tudo se dissipa
A iminência da chegada de visitas ilustres
Ou os efeitos da visita de um certo Roberto
O peito aberto a tudo tão perto
O aperto da partida iminente de alguém tão próximo

Mais uma mudança, outra paisagem: Minas
Quando não pergunto mais aonde vai a estrada
Nem posso mais esperar aquela madrugada
A sina amolada na foice do tempo
Um sabor de velha solidão que se avizinha
As mãos trêmulas e inseguras
Escrevendo tudo o que não adivinha
Nos olhos uma coleção de rostos
No rosto uma coleção de olhares
Outros mares de um outro sul
Um Cortázar tão lido e relido outra vez
Ferindo ainda mais o poeta que morre em mim
Eu, mais antigo que a eternidade
Mais passado do que tudo que passa
Eu, ferido de mudar paisagens
E morrendo aos poucos de saudades...
Eu, perdido em outras cidades
Absorvido por tanto dessas miragens
Luzes na sacada de estrelas mortas
Entre portas de mundos distantes
E inexistentes...
Luz da lua, água na rua
Ruído de carros apontando estranhos destinos
Desatinos de minha mente perturbada
Meus pensamentos clandestinos
Som de sinos, estradas de terra
Poeira e caminhos, meus passos sozinho
Por entre pedras que engendram
Essa costumeira dor no peito
De repente todo o mal já feito
E desfeito qualquer bem que eu teria
Como num romance não escrito
Mas vivido num lugar qualquer
Onde eu puser a imaginação
Que me ponha a sonhar
Eu à janela, as paisagens
As miragens e as vertigens
Ao som sirenes tudo perfeito
Eu já desfeito de sonhar esses dias
A pensar em tudo o que eu sentiria
Nesse encadear de momentos maldito
Bem na hora em que fecha a padaria
E sobe um ônibus cheio a me invadir as paisagens
A colocar-me nos olhos o que não quer meus olhares
Escuto um mar distante, lua no horizonte
Despertador para as seis e meia
O amanhã promete chegar na hora
Tudo fora e eu aqui dentro
Acordar ainda é não viver
Ter que esperar amanhecer
Um outro dia entre miragens
Na miragem de outras paisagens
Marcos Lizardo
Enviado por Marcos Lizardo em 30/09/2009
Reeditado em 07/09/2021
Código do texto: T1839296
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