O BARQUEIRO DA VIDA
Morreu o poeta com sua carga de relatos.
Por certo a humanidade ficará menos fantasiosa,
menos sonhadora,
mais pobre de estímulos.
Corre vida sob pés cansados.
Vento e chuva retratam o espírito triste.
O que se perde em meio à água que corre debaixo
dos pés andarilhos?
É líquido o silêncio nos olhos,
e os passos se fazem permanentes nos trajetos.
Caminha-se em nome de quem e de quê?
De nosso próprio pré-traçado destino?
Margearão a estrada dos acontecimentos
aqueles que ficaram nas veredas do Rio Escuro.
No retorno da poeira ao pó, a luz solitária
vem na hora bíblica.
A amizade antiga produz o último recado:
o poema com o gosto de lágrima.
É preciso conter o choro,
coragem para o coração pulsar vivo.
A vereda ficou pequena, esvaiu-se aos poucos.
Fiandeiras do fio da vida,
é incerto e dúbio o destino traçado
entre o nascer e o morrer.
Haverá lutas, adiante?
Quais desafios nos restam
além da barcarola de Caronte?
É chegada a hora da transposição do Rio Profundo.
Desta para a outra margem, aquela da qual jamais voltou alguém.
A morte é a primeira parada na estrada longa do Eterno.
— É preciso guardar a moeda para pagar o barqueiro da vida!
– Do livro BULA DE REMÉDIO, 2004/2009.
http://www.recantodasletras.com.br/poesias/1838586