LINHAS E ENTRELINHAS
Linhas azuis, linhas paralelas,
simetricamente guardais
as flores em palavras brandas,
os risos em sequências coloridas,
as dores em ziguezagues cruéis.
Por tantas vezes trilhei vossos caminhos,
e do velho, e do novo
e do triste ou patético
entrelaçar de idéias,
fostes sempre o caminho a seguir,
a trilha limpa e acolhedora de meus devaneios.
Linhas azuis que serenamente vos postais
à espera de que minha mão desenhe em vós
o traçado de minh'alma:
ora um tormento a me dilacerar as carnes,
ora uma explosão de amor, ou tédio,
ou fúria incontrolada.
Linhas tão tênues
e no entanto aguardais,
como o lago manso aguarda o suicida.
Não vos darei todo o meu sangue
nem todas as minhas entranhas.
Serei cautelosa...
Não vos darei todas as minhas verdades
nem minhas incertezas mais profundas.
Linhas azuis, por que estais sempre a me tentar
A me ofertar vosso leito confortante?
E eu qual mariposa bêbada
diante dessa luz translúcida,
beberei novamente desse veneno
e sobre as águas límpidas vomitarei.
Não sobrará sequer um ai,
ao teu fascínio não resistirei.
Linhas azuis que como a lua aguarda a noite
me aguardais,
que como os pássaros tendes sempre o rumo certo,
a vós sem luta muita não me entregarei,
a vós sem esse heróico e inútil freio
não caminharei.
Mas é tão doce nesse manso lago deslizar,
do coração tantas palavras escorrendo,
pro vosso leito e em folhas brancas eu desenho,
dizendo certo por caminhos tortuosos,
dizendo mais talvez nas brancas linhas...
Se é meu destino em vós deixar palavras,
meu ser inteiro se alvoroça e treme
qual revoar de insetos na clareira.
Assim de vós eu sei, já sou escrava,
vosso regaço é meu repouso e meu conforto,
temos agora acordo tácito firmado:
mergulharei pra sempre nessas águas calmas
e encontrarei em vós o norte desta estrada.