Você chama medo?
1º ato: O que é? Você chama medo?
Caminhávamos eu e o medo. Ele agarrado em mim apertava a minha garganta quase me impedindo de falar o que queria e fechava o canal das lágrimas, esfriando-as quase à congelar – elas não podiam se esparramar -.
O diálogo entre eu e o medo:
Eu: Nós andamos tanto tempo juntos que eu quase me acostumei com seu hálito e também poderia ser halo.
Ele: E eu já perdi o jeito de ficar livre de você, já te conheço tanto e você me acolhe tão bem! Parecemos o sapato e a meia!
Eu: Tenho querido andar sozinha, mas você está misturado com os meus tecidos como um carrapato grudado na pele do cão, eu me chacoalho e você não solta.
Ele: O seu sangue é doce!
Eu: O teu cheiro me afoga.
Eu: Eu vou para o sol me curar da tua presença.
Ele: Sol? Me aquece também!
Eu: Vou para o gelo para me proteger da dor que você me traz.
Ele: Gelo? Escolho um momento eterno das delícias do teu sangue e fico junto...no nirvana do eterno.
Grudados, inseparáveis, misturados, impotentes pela mistura, parecemos um – parecemos sós – parecemos muitos.
Cansados.
Sozinhos.
Indecisos: gelo ou sol?
Não importa se gelo ou sol continuam juntos eu e o medo.
Caminhando para o 2º ato.
2º ato: Eu medo?
Caminhamos juntos eu e ele, agarrados, misturados até sentir os raios do sol.
Eu: O calor do sol tira a tua presença tão nítida
Ele: É apenas tua ilusão, pois se voltas para mim, aqui estou.
Eu: Sinto meu queixo tremer e o sol me aquecer e posso sentir as lágrimas descondensando, mas não caem!
Ele: Não sou eu que te provoca isso! É o efeito do sol interno.
Eu: Meu coração palpita! Sai daqui!
Ele: Mas não sou que te causa isso. O sol também me faz bem.
Eu: Fique em silêncio, a tua voz me cansa! Deixe-me ficar um pouco bem. Meu queixo treme, meu coração palpita e a minha memória vaga! A lágrima não cai, mas está presente em seu estado denso. E essa respiração? Que me agita! É você?
Juntos e separados.
Silêncio.
Distantes?
Não, é só uma ilusão.
Caminhamos para o 3º ato
Você é minha cisão!
Você é o meu outro lado!
Eu e você, não!
Eu.